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Artigos Segunda-feira, 03 de Novembro de 2025, 14:36 - A | A

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Segunda-feira, 03 de Novembro de 2025, 14h:36 - A | A

ROBERTO RIBEIRO

Enquanto se debate carbono em Belém, as abelhas salvam o Brasil

ROBERTO RIBEIRO

Em meio à vastidão verdejante e à exuberância de um país que se autodenomina celeiro do mundo, reside uma verdade inegável e, por vezes, silenciosa. A vida pulsa no ritmo de seres minúsculos, incansáveis mensageiros alados. Polinizadores. Essas criaturas, de abelhas a borboletas, de morcegos a beija-flores, são os verdadeiros arquitetos invisíveis dos nossos ecossistemas e da nossa economia. Enquanto as salas de hotel em Belém se esgotam para a COP 30 e os diplomatas debatem metas duvidosas, esses insetos continuam seu trabalho de sempre, sem conferências, sem coletivas de imprensa, sem selos de certificação. Enquanto discutimos, eles regeneram. Se os perdêssemos, sacrificaríamos mais do que rendimento agrícola. Perderíamos a própria capacidade de renovação de nossas florestas, a qualidade nutricional dos alimentos em nossa mesa e, em última análise, o futuro de nossa nação. Com eles, no entanto, ganhamos produtividade, resiliência e infinitas opções de um amanhã mais próspero e equilibrado. Desde que tenhamos sabedoria de reconhecer que eles não precisam de nós, mas nós, absolutamente, precisamos deles.

Minha alma de pesquisador e meu coração enamorado pela natureza observam com reverência a intrincada teia que esses heróis da biodiversidade tecem. Eles são os "nós" vibrantes nas redes de interação que sustentam floradas, garantem os fluxos de energia e perpetuam os ciclos de vida. Imagine um Brasil sem a diversidade de cores, sabores e aromas que a polinização proporciona! A estabilidade dessas redes não é um mero capricho biológico, é um seguro de vida contra estressores como o fogo, a seca e o uso indiscriminado de agroquímicos.

Mas o valor dos polinizadores transcende a poesia ecológica. A robustez da nossa produção agrícola, a uniformidade e o valor nutricional de culturas essenciais. Tudo isso depende da polinização eficiente. Significa mais alimento por hectare, safras mais consistentes e, consequentemente, pilares sólidos para a segurança alimentar. Além disso, em um planeta cada vez mais afetado pelas mudanças climáticas, paisagens com mosaicos florais e populações saudáveis de polinizadores agem como amortecedores naturais, acelerando a recuperação pós-distúrbios e mantendo a reprodução das plantas que estruturam solos, encostas e margens de rios. E não nos esqueçamos da economia local, da bioeconomia, a meliponicultura, o turismo de natureza e a vasta gama de produtos não madeireiros são sustentados, direta ou indiretamente, por esses serviços vitais, gerando renda alinhada à mais profunda conservação.

A ciência, com sua busca incessante pela verdade, nos oferece ferramentas para quantificar essa importância inestimável. Metodologias refinadas, como os fatores de dependência por cultura e os cenários de risco que avaliam a probabilidade de déficit de polinizadores, desvendam o impacto econômico e os efeitos em cascata na produção e nos preços. Estudos recentes no Brasil, como os de Chaudhary et al. (2024) e Giannini et al. (2024), atualizam o valor econômico da polinização e mapeiam os "hotspots" de vulnerabilidade em nossas cadeias alimentares, revelando a urgência de ação. As avaliações em áreas protegidas, por sua vez, demonstram que a conservação não é um custo, mas um investimento que gera "dividendos de polinização" detectáveis nas economias locais. O valor, portanto, não é apenas um faturamento adicional na fazenda, mas uma redução de riscos, a estabilidade da oferta e um custo menor de adaptação climática.

O consenso científico global, consolidado pelo IPBES (Plataforma Intergovernamental de Políticas Científicas sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos), é um alerta claro. Polinizadores silvestres estão em declínio em muitas regiões, vítimas da alteração do uso da terra, da intensificação agrícola, de pesticidas e das mudanças climáticas. A diversidade de espécies é fundamental para a estabilidade e qualidade dos frutos, e práticas agroecológicas são a chave para conciliar produtividade e conservação. É vital entender que abelhas manejadas complementam, mas jamais substituem as silvestres. Precisamos de ambas para maximizar rendimento e resiliência. E, acima de tudo, políticas integradas - abraçando agricultura, meio ambiente, saúde e ciência - são indispensáveis para reverter essa trajetória perigosa.

O risco de um déficit de polinizadores é palpável, manifestando-se em fronteiras agrícolas, em regiões com baixa cobertura de habitats naturais e no uso intensivo de agroquímicos. Secas prolongadas e ondas de calor criam "janelas de descompasso", alterando o delicado equilíbrio entre a floração e a atividade dos polinizadores. Esse déficit não é um problema isolado, ele se traduz em volatilidade de preços, necessidade de insumos substitutos, perda de competitividade e pressão sobre importações.

É por isso que a política pública no Brasil, com iniciativas como o Plano de Ação Nacional para Polinizadores (PAN Polinizadores, 2024), assume um papel fundamental. Ele define uma agenda nacional ambiciosa, conectando pesquisa, manejo, monitoramento e produção sustentável, integrando a meliponicultura como um vetor de engajamento produtivo e educação ambiental. Instrumentos como crédito rural e seguro agrícola condicionados a práticas amigas dos polinizadores, zonas tampão, pagamentos por serviços ecossistêmicos (PSE) e compras públicas conscientes são cruciais para acelerar resultados.

Para a ciência e para aqueles que detêm o poder de decisão, as prioridades são claras: desenvolver mapas dinâmicos de risco, integrar a valoração da polinização em contas nacionais, desenhar "paisagens performáticas" que maximizem rendimento e estabilidade, e mensurar sinergias e trade-offs de práticas sustentáveis. A meliponicultura, com seu potencial para gerar renda e conservação, precisa ser elevada a uma política pública sólida.

O Brasil é um campeão mundial de biodiversidade e de produção agrícola. Minha paixão me impele a clamar: manter os polinizadores é manter essa dupla liderança! A conta sempre fechará quando conservação e produtividade andam de mãos dadas, e os dados científicos nos mostram que isso não é apenas possível, é imperativo. É a nossa oportunidade de reafirmar nosso compromisso com a vida, com a ciência e com o legado que deixaremos para as futuras gerações. É o pulso da natureza que clama por nossa ação agora.

Enquanto o relógio biológico avança, cada flor não polinizada é um eco de um futuro que se esvai. Cientistas alertam e a natureza suplica. A escolha é nossa, e a hora é esta! Vamos defender esses mensageiros da vida com a mesma paixão com que eles tecem a teia da existência. Ergamos nossa voz em apoio à ciência. O legado que deixaremos será o jardim que cultivamos ou o deserto que permitimos. Qual futuro você escolherá para os nossos biomas?

(*) ROBERTO RIBEIRO é biólogo, pesquisador, poeta (pra quem tem o direito de ver), meliponicultor e especialista em ecologia, biodiversidade e abelhas nativas.

Os artigos assinados são de responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a opinião do site de notícias www.hnt.com.br

 

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