O clima político no Brasil já está quente e tende a se intensificar com a aproximação das eleições de 2026. Essa será a primeira grande disputa em que os efeitos da inteligência artificial (IA) sobre a escolha do eleitorado estarão realmente à prova. Claro que ainda levará tempo para mensurar com precisão seu impacto, mas um ponto já é evidente: o avanço da IA pode não apenas baratear campanhas, como também potencializar a produção e circulação de desinformação com uma sofisticação sem precedentes.
Vídeos inteiramente gerados por IA, muitos deles imperceptíveis ao público, já circulam amplamente nas redes sociais. Embora os discursos sobre os benefícios dessa tecnologia dominem o debate público, pouco se discute, de forma crítica, os riscos sociais e políticos associados ao seu uso crescente na comunicação política. A IA tende a ocupar espaço na disputa: seja na personalização de mensagens, seja na propagação automatizada de conteúdos manipulados. O risco não reside apenas na automação da linguagem política, mas na sua capacidade de simular pessoas, fabricar falas, falsificar contextos e manipular emoções.
Campanhas políticas nos Estados Unidos já utilizam inteligência artificial para gerar imagens e anúncios ajustados ao perfil emocional dos eleitores. No Reino Unido, a divulgação de um vídeo com cenas hiper-realistas de violência e degradação urbana provocou intensas críticas ao explorar medos sociais com base em cenários simulados. O episódio escancarou os dilemas éticos da propaganda política ancorada em simulações verossímeis, mas não factuais.
No contexto brasileiro, essa lógica já começa a se manifestar. Em um evento recente promovido pelo PL, Jair Bolsonaro exaltou a IA como uma “nova arma” da comunicação política. A presença de representantes de big techs foi amplamente divulgada, e os palestrantes, segundo a imprensa, apresentaram ao público “a receita para usá-la”. O episódio evidencia que setores da direita vêm assimilando o potencial simbólico da IA e se articulam estrategicamente para utilizá-la como instrumento de disputa política já nas eleições de 2026.
A gravidade desse cenário aumenta em um país sem regulação e letramento digital extremamente desigual. A maioria da população consome informação via redes sociais, muitas vezes sem distinguir o que foi gerado por humanos ou por sistemas automatizados. Essa assimetria entre quem domina a tecnologia e quem a consome, sem mediação crítica, cria as condições ideais para a manipulação em larga escala da opinião pública.
Se nada for feito, corremos o risco de enfrentar, em 2026, uma guerra perigosa de narrativas, em que poucos manipulam muitos, e onde o voto, embora formalmente livre, poderá ser conduzido por percepções artificiais.
(*) VANESSA MARQUES é jornalista, mestre em comunicação na Espanha, e atua há 20 anos na comunicação política, com 13 anos de experiência como coordenadora de comunicação de mandato na Câmara dos Deputados.
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