Em todo o país, empresas de diferentes portes têm enfrentado um ambiente de fiscalização mais rigoroso em matéria penal econômica. Uma das consequências visíveis é a maior deflagração de buscas e apreensões em sedes administrativas, unidades fabris e, principalmente, residências de executivos. O movimento reflete a prioridade das autoridades em coletar provas digitais e documentais com agilidade, especialmente em casos de suspeitas envolvendo fraudes, corrupção, concorrência desleal, crimes tributários, ambientais e lavagem de dinheiro.
A busca e apreensão é uma medida cautelar, que deve ser autorizada pelo Poder Judiciário, tem como objetivo colher evidências relevantes para uma investigação. Em empresas, costuma abranger computadores, celulares corporativos, servidores, mídias, contratos, livros societários e correspondências eletrônicas. Embora seja um instrumento legal legítimo, é uma medida invasiva que traz consigo o risco de paralisar rotinas corporativas e precipitar uma crise reputacional.
Efetivamente, a pressão de consumidores, investidores e sociedade por integridade corporativa mantém o tema em destaque no noticiário, ampliando o escrutínio sobre condutas empresariais, revelando uma necessidade maior de agir conforme.
Setores mais regulados – como saúde, financeiro, energia, infraestrutura, construção, mineração e meio ambiente – tendem a apresentar exposição maior, mas varejo, tecnologia e logística também figuram em investigações quando há suspeitas em cadeia de fornecimento, uso irregular de dados, fraudes contratuais ou práticas comerciais abusivas. Empresas de médio porte não estão imunes: a complexidade das operações e o uso de terceiros podem criar riscos muitas vezes subestimados.
Na dimensão reputacional, a janela crítica são as primeiras 24 a 72 horas. Imagens de diligências e especulações nas redes sociais criam um vácuo fácil de ser preenchido por narrativas imprecisas e, por vezes, até tendenciosas. Clientes e parceiros tendem a adotar postura cautelosa, e bancos, seguradoras e fornecedores podem reavaliar limites de crédito, prazos e apólices, questionando, até mesmo, a possibilidade de encerrar o relacionamento. Justamente por isso é que a forma como a empresa comunica e se porta nesse período costuma definir a curva de recuperação de confiança.
Importa destacar que busca e apreensão não equivale a condenação, tampouco comprova culpa. É uma etapa investigativa. Ainda assim, a ausência de preparação processual e comunicacional pode criar danos duradouros. Stakeholders avaliam tanto o fato investigado quanto a maturidade da resposta: se há cooperação dentro dos marcos legais, preservação de evidências, respeito a colaboradores e comunicação objetiva.
Em paralelo, é prudente mapear os públicos críticos: colaboradores, clientes-chave, fornecedores estratégicos, bancos, reguladores, comunidade do entorno e entidades setoriais. Cada um demanda um tipo de abordagem distinto, de modo que a falta de coordenação entre o jurídico e a comunicação pode expor a empresa a riscos desnecessários – e, no limite, a novas frentes de questionamento.
Vale lembrar que crises desse tipo muitas vezes revelam fragilidades anteriores: políticas genéricas, terceirização sem due diligence, registros incompletos, controles sinuosos e falta de supervisão independente. Tratar apenas o episódio, sem enfrentar suas causas, dá a falsa sensação de resolução e mantém o risco latente.
Medidas para reduzir o risco começam por um mapa de riscos penais do negócio, revisitado anualmente e a cada mudança relevante, cujo exercício deve identificar processos sensíveis, pontos de contato com o setor público, intermediários, benefícios fiscais, autorizações regulatórias e fluxos financeiros atípicos, ranqueando impactos e probabilidades.
Por essa razão, um programa de compliance criminal efetivo – não apenas formal – é peça central. Isso inclui políticas específicas (antissuborno, concorrencial, fraude, ambiental e tributária), regras de hospitalidade e patrocínios, controles de pagamentos a terceiros, segregação de funções e aprovações escalonadas. Além disso, o canal de denúncias deve ser independente, acessível e protegido contra retaliação, com investigação interna técnica e rastreável.
Como antecipado, terceiros são um vetor relevante. Por essa razão, a adoção de due diligence proporcional ao risco, cláusulas contratuais de integridade, direitos de auditoria, verificação de beneficiário final e monitoramento contínuo ajudam a prevenir que a empresa herde passivos penais de parceiros, distribuidores, consultores ou fornecedores críticos.
Por outro lado, quando a operação policial já está em curso, o papel do advogado criminalista é o de coordenar a resposta jurídica no local: verificar o mandado, conferir o escopo e as limitações (pessoas, salas, horários, meios digitais), acompanhar diligências, registrar inconsistências, bem como zelar por sigilos profissionais e industriais.
Ainda, é dever também orientar colaboradores sobre seus direitos, evitar autoincriminação involuntária, separar materiais manifestamente alheios à investigação e requerer, quando cabível, lacração, cópias forenses e termos detalhados. Nas horas seguintes, o profissional conduz pedidos de restituição, medidas de urgência e um early case assessment para mapear exposição penal, processual e regulatória.
A mensagem final para o mundo corporativo é clara: a melhor defesa é a prevenção. Investir em governança, controles e preparo para eventos de alta pressão diminui a probabilidade de investigações, melhora a capacidade de resposta e protege a reputação. Não obstante, caso o risco tenha se concretizado, há o que ser feito: a busca por uma orientação jurídica, especialmente conduzida por um consultor externo, poderá contribuir para a mitigação da crise que, por vezes, pode ser estancada.
(*) MATHEUS BAZZI é Advogado Criminalista. Mestrando em Direito pela UNISINOS/RS. Professor de Direito Penal da Universidade de Cuiabá. Pós-graduado em Advocacia Criminal pela ESA/MG. Presidente da Comissão de Direito Penal e Processo Penal da OAB/MT.
Os artigos assinados são de responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a opinião do site de notícias www.hnt.com.br
Clique aqui e faça parte no nosso grupo para receber as últimas do HiperNoticias.
Clique aqui e faça parte do nosso grupo no Telegram.
Siga-nos no TWITTER ; INSTAGRAM e FACEBOOK e acompanhe as notícias em primeira mão.