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Segunda-feira, 05 de Fevereiro de 2018, 08h:50

Abandono, decadência e casarões em ruínas retratam o Centro Histórico de Cuiabá

JESSICA BACHEGA

“A celebração dos 300 anos de Cuiabá corre um grande risco de se transformar em um conjunto de shows, sem nenhum resgate da memória da Capital”, analisa o advogado e escritor Eduardo Mahon sobre o trabalho de revitalização do Centro Histórico, que caminha a passos lentos.

 

Reprodução

casa paulo murtinho centro historico

 

O local onde se estabeleceram as mais nobres famílias da antiga Cuiabá se tornou um amontoado de casas e casarões centenários em decomposição. A má conservação dos imóveis polui a paisagem da cidade e repele turistas e cuiabanos que circulam pela região. “Isso prejudica até mesmo o comércio, pois as pessoas só chegam até o calçadão. Não vem para cá”, diz a atendente de uma loja de artesanatos, nas proximidades da rua Voluntários da Pátria e da Igreja Nossa Senhora dos Passos, indicada como Ponto Turístico, mas que também não está com boa aparência

 

Se por um lado os casarões não atraem os visitantes e não representam mais a bela Cuiabá, por outro eles têm função primordial para o abrigo de animais, cultivo de plantas daninhas e moradia para usuários de entorpecentes, para citar apenas algumas das finalidades às quais servem.

 

As paredes de alguns imóveis, que ameaçam cair a qualquer momento, são apreciadas por “artistas populares” que as usam como telas a céu aberto para deixar sua arte em forma de protesto político ou demonstração do amor, na maioria das vezes rejeitado. Em uma central de distribuição de energia ao lado da Casa Barão de Melgaço, um poeta pichou em letras cor de rosa “Ame mais”, e um coração. Os atos de vandalismo estão espalhados por toda a parte, se misturando ao lodo e a sujeira acumulados nas paredes que há muito não recebem pintura.

 

Em outro ponto do centro, uma comerciante reclama de um enorme buraco que se formou em frente a loja nos últimos dias. “É uma vergonha isso aqui. Era um buraco pequeno. Uma mulher passa por aqui de carro e, de repente, abriu o buraco ela ficou com o pneu preso. Depois a prefeitura veio arrumar e piorou. Agora a rua está toda a aberta”, diz Vera Lucia Mendes, que trabalha em uma loja de roupas infantis há mais de oito anos.

 

Alan Cosme/HiperNoticias

centro velho de Cuiabá

 

Ela diz que além do buraco representar risco à segurança das pessoas e danos aos veículos, também existem os tapumes que circundam uma obra que há tempos está em andamento. “A madeira prejudica a visão dos motoristas. Eu já vi vários acidentes aqui, porque quem para na esquina não consegue ver quem atravessa a rua. Isso aqui é uma vergonha. Bem ao lado da prefeitura e ninguém conserta”, relata a mulher que já presenciou vários acidentes no local.

 

Os imóveis que abrigam casas comerciais e apresentam fachadas repaginadas contrastam com espaços que já foram símbolo de lazer, cultura e tradição entre as famílias cuiabanas. Um exemplo é o cine Bandeirantes, inaugurado em 1963 e hoje deixado de lado. A fachada encardida e rasgada sinaliza o local onde tantos filmes foram assistidos nos tempos áureos do cinema e que foi o ponto alto da semana de muitas pessoas.

 

Casarões como o da antiga Livraria Pepe também são exemplos da decadência da região. Concedida à prefeitura em regime de comodato, a Casa de Bem Bem abriga o projeto Ciranda e desabou no meio do processo de revitalização, ainda no ano passado. Para evitar maiores danos, uma cobertura foi erguida no local onde as obras seguem conforme a chuva permite.

 

Outra casa em completo abandono está localizada no número 79 da Rua Pedro Celestino. No imóvel morou o ex-auditor da Receita Federal, Paulo Murtinho, sobrinho do ministro  Joaquim Murtinho. O antigo dono morreu em 2002 e não deixou herdeiros. Hoje a casa é tombada e está sob os cuidados da prefeitura.

 

Alan Cosme/HiperNoticias

buraco no centro velho de Cuiabá

 

As calçadas e ruas estreitas, características dos tempos em que não haviam carros circulando pelo centro, não têm acessibilidade e exigem que o pedestre realize uma verdadeira corrida de obstáculos para desviar dos bueiros, buracos, postes de energia e placas do comércio existente no local. Pessoas com deficiência raramente circulam pela região.

 

A revitalização do Centro Histórico é parte das metas do Executivo Municipal para celebrar o Tricentenário da Capital, porém nem toda região será contemplada. “Há imóveis que estão com longo processo de inventário e que a família não restaura. A prefeitura não tem como intervir nessas situações”, afirma a assessoria da prefeitura. Sobre os buracos nas ruas, a assessoria da Secretaria de Obras informou que está apenas aguardando uma trégua da chuva para retomar os reparos.

 

A justificativa é criticada pelo escritor Eduardo Mahon, que acredita que é possível o poder público agir para que o patrimônio histórico da cidade não se perca. “Ela não pode restaurar porque não é de responsabilidade da prefeitura, mas pode notificar o proprietário para que tome providências sobre isso. Também não dão incentivo para que os donos reformem o local e isso demanda muito dinheiro”, afirma.

 

Para o escritor, o interesse político também é um impeditivo para que obras sejam realizadas no local. “Não dá voto reformar o centro. O que é melhor é asfaltar ruas de algum bairro. Isso sim tem retorno”, declara.

 

Os usuários de drogas são outro problema que contribui para a degradação do centro. Eles estão por toda a parte e se abrigam em todo local que possibilita proteção da chuva e do sol. Na ânsia de conseguir dinheiro para o consumo do entorpecente, praticam furtos, abordam transeuntes e invadem casas. Como foi o caso da Casa Barão, que teve os fios elétricos furtados há cerca de 15 dias e já sofreu cerca de 20 furtos.

 

Alan Cosme/HiperNoticias

centro velho de Cuiabá

 

A Secretaria de Estado de Cultura realizou uma força tarefa para intensificar o policiamento no local, mas comerciantes afirmam que a ação surtiu pouco efeito. “Recebi notícias de que nada mudou na região”, reforça Mahon.

 

 Quanto aos Casarões do Centro Histórico a primeira obra a ser entregue nesta gestão, foi a Casa Barão – Academia Mato-grossense de Letras e Instituto Histórico e Geográfico, que passou a ser de responsabilidade das entidades que ocupam o local.

 

O próximo casarão a ser entregue será o Misc – Museu da Imagem e do Som, que deverá ser entregue no final de fevereiro.

 

A Casa de Bem Bem, no mês de dezembro recebeu uma visita técnica, com representantes do IPHAN, da empresa responsável pela revitalização e da família Palma, proprietária do imóvel, e do secretário de Cultura, Esporte e Turismo, Francisco Vuolo, na busca dos encaminhamentos corretos para sanar quaisquer dificuldades. Ficou definido que as obras de reforma serão retomadas a partir desta semana.  A definição ocorreu após ajustes nos procedimentos administrativos no convênio em comum acordo com a empresa responsável pela obra, com a intervenção da Procuradoria Geral do Município. A Secretaria tem observado os prazos previstos no convênio e tem sistematicamente cobrado da empresa os procedimentos cabíveis para regular a execução da obra contratada.

 

Na sequência vem a Casa 79, que receberá uma intervenção emergencial, realizada pela secretaria de Obras para evitar maiores danos à propriedade de terceiros. Após as intervenção será realizada uma nova licitação para reforma completa do local.

 

A Casa do Patrimônio – onde funciona a sede do IPHAN - fará a licitação local, tão logo o órgão se mude para o outro prédio cedido pela prefeitura onde funcionava a assistência social do município, terá iniciada a reforma.

 

A Casa Irmã Dulce está sob a responsabilidade integral do IPHAN.

 

As Casas Procon, Funai e 155 estão em fase de adequação do projeto.