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Cidades Sexta-feira, 04 de Outubro de 2019, 17:03 - A | A

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Sexta-feira, 04 de Outubro de 2019, 17h:03 - A | A

ENTREVISTA ESPECIAL

“É um vampiro emocional”, diz psicólogo sobre homens abusadores

KHAYO RIBEIRO

HiperNotí­cias

douglas amorim

Douglas Amorim é psicólogo em Cuiabá

Em oito meses, de janeiro a agosto deste ano, Mato Grosso registrou 59 casos de mortes de mulheres, segundo um balanço da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp). Dessas ocorrências, 37% tiveram motivação passional.

Em entrevista exclusiva ao HiperNotícias, o psicólogo Douglas Amorim fez um avaliação dos relacionamentos abusivos e disparou: “O narcisista é um vampiro emocional”. Ele é especializado em ajudar pessoas a sairem de relacionamentos tóxicos e tem atualmente no seu Instagram, @umpsicologoemcuiaba, mais de 15 mil seguidores.

Confira os principais trechos da conversa:

HNT/HiperNotícias - Mulheres de diversos grupos sociais são violentadas diariamente. Contudo, é possível definir um perfil emocional dessas mulheres?

Douglas Amorim - “Nós temos uma estrutura social, e histórica, em que a mulher é vista como um apêndice do homem, como um ser dependente e a gente vai chamar isso de machismo. A mulher de alguma forma se vê como a pessoa que tem se submeter. E muitas vezes ela não tem redes de apoio que dão para ela a possibilidade de se posicionar, inclusive com o ponto final. Muitas vezes, elas entram nessas relações com a esperança de que encontrarão a pessoa certa, a pessoa que vai construir uma vida com elas, que vai respeitá-la, que pode ter a possiblidade de estar em patamares de igualdade, ou equiparadas. Aí, de repente, por conta das entregas emocionais, elas se veem muitas vezes dando uma segunda, terceira ou quarta chance.”

HNT/HiperNotícias - Quais são os relatos das mulheres que permaneceram durante muito tempo em situações de abuso?

"A gente divide esses abusadores em dois grupos, os vulneráveis e os perversos"

Douglas Amorim - “Muitas permanecem por conta de ameaças veladas ou não declaradas, tipo ‘de matar os filhos’, ‘eu estou pensando umas besteiras aí’ e ‘se a gente terminar, eu não sei o que fazer da minha vida’. Com essa responsabilidade emocional que é jogada nas mulheres, muitas vezes elas se veem dentro de um cativeiro emocional e não conseguem sair daquilo. Então, de modo geral, acho que o início do processo de abuso, que faz a vítima permanecer, é o medo. O medo de sair e perder alguma coisa.”

HNT/HiperNotícias - É possível definir um tipo específico de quem são os homens abusadores?

Douglas Amorim - “Muitas vezes, a mulher coloca sobre si uma expectativa emocional de ter ali o príncipe encantado e aí a gente vai lá naquelas questões mais romantizadas das relações amorosas, em que a mulher coloca o homem na posição de salvador. O interessante é que em todas as histórias românticas é isso, a figura do homem fica em uma posição de salvadora. E, muitas vezes, o abusador sabe que esse perfil é uma isca para as vítimas. Então, o homem muitas vezes fala até que a mulher não precisa trabalhar, que ele vai cuidar dela. O que eu oriento muitas vezes é ter cuidado com os salvadores, essas pessoas que chegam de repente e se colocam em um lugar de quem vai mudar completamente sua vida, que vai te ajudar, que vai te tirar de uma situação familiar ruim. Muitas mulheres, às vezes, se casam e se entregam emocional e financeiramente para esses homens por conta de quererem se libertar de algum tipo de estrutura familiar ruim.”

"O que eu oriento muitas vezes é ter cuidado com os salvadores, essas pessoas que chegam de repente e se colocam em um lugar de quem vai mudar completamente sua vida, que vai te ajudar"

HNT/HiperNotícias - Além do “salvador”, existe algum outro perfil típico que pode ser aplicado aos abusadores?

Douglas Amorim - “Temos outro modelo em que os caras colocam as mulheres como salvadoras, do tipo ‘só você pode me ajudar’, ‘só você me aguenta’ e ‘só você me ama’. Os relatos vão por essas duas vias, não têm muitas variações. Quando eu começo a falar disso no consultório, muitas mulheres falam ‘nossa, você está narrando minha vida’, porque não há tantas abordagens assim, não é tão plural. Normalmente, os abusadores vão por esses dois caminhos, ou o de vulnerabilidade ou de salvadores. E, assim, começa a minar na vítima a independência emocional. Ela se sente presa de uma forma que não consegue sair. Inicialmente, esse cativeiro é construído de forma muito sutil, de forma tal que a vítima não percebe, até acabar em ameaças. A gente divide esses abusadores em dois grupos, os vulneráveis e os perversos, que fazem ameaças mais declaradas, como ‘eu que mando aqui’, ‘você vai fazer só o que eu quiser’ e ‘se você não ficar comigo, eu posso fazer alguma coisa com você e com nossos filhos’.

HNT/HiperNotícias - O Brasil é um país com distribuição de renda muito irregular. E algumas dessas mulheres são financeiramente dependentes de seus companheiros. Nesse sentido, é economicamente possível que as vítimas tenham acesso a tratamentos psicológicos?

Douglas Amorim - “É muito complicado falar sobre isso, porque a saúde mental ainda é colocada em um patamar de luxo. As pessoas ainda enxergam como algo caro. Então, cabe uma desmistificação disso tudo. É claro que é um dinheiro que vai ser investido, mas tem vias gratuitas que cabem no orçamento das pessoas, tem as clínicas-escolas, os profissionais com valores sociais. Então, o primeiro trabalho é descontruir isso. Mas tem pessoas que não procuram porque não acreditam que aquilo pode, de fato, ajudá-la. Eu recebo muitas pessoas que vem ao meu consultório por conta de um texto, de uma frase que eu postei, de um vídeo e dizem que achavam que não poderiam ser ajudados. E, de repente, você olha para a pessoa e a vê com uma bolsa nova, com um celular do ano, com um carro do ano. Então, você pensa assim que não é uma questão de falta de recurso, necessariamente. É uma questão de educação, de entendimento de que a psicologia pode fazer.”

HiperNotí­cias

douglas amorim

 Psicólogo dá dicas de como identificar relações abusivas

"Infelizmente, há mulheres que acabam se tornando mais um número, porque ela não teve a capacidade financeira de, de repente, desaparecer instantaneamente, ir para outra cidade"

HNT/HiperNotícias - Como a violência acontece em situações nas quais as mulheres estejam socialmente mais vulneráveis?

Douglas Amorim - “Infelizmente, a maior parte da violência doméstica ainda acontece com as mulheres negras e pobres. É claro que acontece com as pessoas de classe média e com as brancas, e o número é alarmante em todos os casos. Mas eu percebo que a população negra e pobre é a que é mais atingida e que se sente mais isolada, mais solitária, porque não tem uma rede de apoio. Essa rede é composta pelo acesso à informação, pela possiblidade financeira de se cuidar e, de repente, fazer movimentos de independência. Isso porque a mulher negra e pobre, que foi colocada no cenário de mãe de família, muitas vezes não consegue imaginar como vai fazer para se sustentar, caso diga 'não' para esse homem. A nossa rede de proteção ligada às políticas públicas, como a nossa lei, por exemplo, ainda é limitada, ainda de fato não protege a mulher que não tem a possiblidade financeira de se proteger. Então, hoje, você ainda consegue ver muitos casos de mulheres que dizem assim “eu consegui me separar”, porque ela conseguiu sair de casa, conseguiu colocar o cara para fora de casa. Porém, infelizmente, ela acaba se tornando mais um número, porque ela não teve a capacidade financeira de, de repente, desaparecer instantaneamente, ir para outra cidade.”

HNT/HiperNotícias - É comum que as mulheres fiquem presas a relacionamentos abusivos durante um longo período. Quais são as fases desse ciclo de violências?

Douglas Amorim - “O agressor justifica para si a própria violência, para dar conta da culpa. Mas chega um momento em que essa culpa vai reduzindo, porque tudo o que a gente faz com frequência, tende a dessensibilizar, isso vai sendo naturalizado. É natural até para a relação. Algumas pessoas ao redor até naturalizam as agressões dizendo ‘é o jeito deles’. E depois que ele faz esse ciclo

"Tudo o que a gente faz com frequência a gente tende a dessensibilizar. As agressões vão sendo naturalizadas. É natural até para a relação. Algumas pessoas ao redor até naturalizam aquilo dizendo ‘é o jeito deles"

de abuso, mesmo se justificando para si, ele tem um momento de consciência, nesse momento ele vai adquirir partir para a manipulação. Daí ou ele finge para a vítima que se arrependeu, ou ele tenta buscar uma ajuda que é mais para manter a vítima, do que honestamente buscar uma ajuda para mudar a situação, ou ele cria uma rede de apoio ao redor com pessoas que o ajudam a manter a vítima. Daí ele se queixa para amigos da vítima que tenta mudar, mas não consegue. Essas pessoas, depois, muitas vezes, não percebem que estão sendo manipuladas e prendem as vítimas com ‘tadinho dele’, ‘dá mais uma chance’ ou ‘ele está tentando’. Tem esse ciclo que faz com que a vítima permaneça. Então, em algum momento, ela acaba alimentando sua permanência com duas coisas: a memória de como foi no início e a esperança de que isso vai mudar. Isso se deve ao fato de que o presente é insuportável.”

HNT/HiperNotícias - Como um homem pode se perceber como um abusador?

Douglas Amorim - “Uma das primeiras coisas é quando você percebe que há emoções negativas ligadas a essa pessoa. Que emoções são essas? Às vezes, é inveja, raiva, misoginia. Ele acha que o homem é o centro do universo, que a mulher é uma servidora. Você percebe esse tipo de pensamento em você? Que o homem merece mais que a mulher em algum nível? Esse é o processo de abuso. Outra coisa é quando o homem se percebe mentindo ou manipulando. Qualquer tipo de mentira, para se livrar de uma consequência, para ter uma vantagem. O abuso começa dessa forma. A gente fala de violência doméstica e sobre o sujeito que levanta a mão e bate na mulher, mas tem abusos que são mais sutis. Um exemplo é o domínio emocional. O sujeito coloca a mulher em um lugar de subserviência, ele joga sobre ela toda a responsabilidade emocional por ele. A mulher se vê muitas vezes mudando comportamentos e vontades por conta do homem e não é um acordo. ‘Eu até gostaria de fazer, mas eu não vou fazer porque vai irritá-lo, vai deixar ele triste’, contam algumas mulheres. Abuso é tudo aquilo que reduz o outro ou reduz o outro às próprias vontades.”

HNT/HiperNotícias - Há tratamentos disponíveis para os abusadores?

Entre as características de um abusador pode ser que ele tem um transtorno de personalidade narcisística e é empatia zero. Ele nunca se coloca no lugar do outro, ele só quer alimentar o ego"

Douglas Amorim - “Muitas vezes eu recebo homens e o desejo é de mudança, de entender, de modificar e cessar o processo de abuso, mas você vê que no comportamento a intenção é manipular a vítima. Eles procuram ajuda para falar para a vítima que procuraram e pedir uma segunda, terceira ou quarta chance. Daí eles querem poder dizer que ‘meu psicólogo disse tal coisa’. A pessoa que é abusadora sente prazer em manipular, então eles sentem prazer em manipular o profissional de saúde mental. E quando eu percebo isso eu confronto, eu afronto isso. E, por conta disso, eu acredito que em alguns níveis é muito complicado perceber que a pessoa realmente quer algum tipo de mudança. As características de um abusador às vezes pode ser que ele tem um transtorno de personalidade narcisística e ele tem empatia zero. Ele nunca se coloca no lugar do outro, ele só quer alimentar o ego, lidar com as próprias inseguranças a partir do que ele pode sugar do outro. Então, o narcisista ele é um vampiro emocional. Então, ele não se importa com absolutamente nada, o único prazer dele é manipular.”

HNT/HiperNotícias - Em alguma dos casos de feminicídio, o homem se mata após matar a vítima. O que leva esses abusadores ao suicídio?

Douglas Amorim - “O que leva esses homens ao suicídio é o medo das consequências, não é a culpa. O medo do que vai vir depois. Porque a culpa é baseada em empatia. Então, se eles tivessem empatia, eles entenderiam que estão causando mal a uma pessoa. Assim, isso seria interrompido, cessado antes de chegar ao extremo de cometer um assassinato ou uma violência grave. Eles não querem se submeter às consequências. Eles não suportam emoções negativas, ao ponto que se a vítima o largou ele não suporta a sensação de ter sido deixado e aí ele vai às últimas instâncias para lidar com essas emoções negativas. Ele não consegue imaginar que vai responder com suas ações. Às vezes, a gente até vê em algumas cartas, mas eu acredito que é medo das consequências.”

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Walquiria 09/11/2020

Ótima explicação dada pelo profissional!

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