O juiz Marcos Faleiros, titular 11ª Vara de Crimes Militares da Comarca de Cuiabá, afirma que o suposto “escritório clandestino de espionagem” em Mato Grosso remonta aos tempos da Ditadura Militar brasileira e avalia ainda que governo do Estado corre risco de se tornar réu em processo internacional por conta da existência da suposta rede de interceptações telefônicas ilegais.
Para o magistrado, os fatos narrados no inquérito da Polícia Militar, até o momento, apontam para grave violação do “right of privacy” (direto à privacidade), além de “direitos e garantias individuais inegociáveis consolidadas na Constituição”. E, ao mesmo tempo, ferem tratados internacionais, como a Declaração Universal de Direitos do Homem, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, e também a Convenção Americana sobre Direitos Humanos.
“Insta salientar que a gravidade concreta dos fatos, já mencionada acima que, além de transgredir a Constituição e tratados internacionais, houve a utilização da máquina estatal para fins de espionagem de jornalistas, políticos, desembargadores, etc., ofendendo a democracia e comprometendo as investigações de crimes graves que acontecem no Estado de Mato Grosso, bem como aviltando a credibilidade da Polícia Militar e de órgãos de inteligência importantes, tais como o GAECO”, escreveu o juiz.
Outro trecho da decisão deixa clara a comparação com os tempos mais duros da ditadura militar: “ com práticas que remontam aos tempos sombrios do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), utilizado na Ditadura Militar para censurar e reprimir movimentos políticos e sociais contrários ao regime de situação no poder, de forma a sustentar aqueles que se encontram no poder”.
Prisão de coronel
Nesta terça-feira (23), Faleiros decretou a prisão do coronel PM Zaqueu Barbosa, ex-comandante-geral da PM de Mato Grosso, e do cabo Gerson Ferreira Gouveia Júnior. Ambos estariam envolvidos no esquema clandestino de espionagem telefônica no estado, que veio a público há cerca de duas semanas.
Zaqueu é apontado como o mandante das ações militares de interceptações telefônicas, enquanto Gerson Júnior, o operador do esquema, responsável por produzir relatórios dos grampos ilegais. A prisão dos dois, conforme o magistrado, busca garantir a ordem pública.
“O suposto esquema de grampos clandestinos militares, feito por alguns Policiais Militares, tinha a finalidade de espionagem política, escuta de advogados no exercício de sua função, jornalistas – cujo sigilo da fonte é constitucional - desembargadores, deputados – com foro de prerrogativa- e médicos, cuja relação com o paciente também é sigilosa”, traz a decisão.
Conforme o magistrado, estima-se que foram grampeados ilegalmente entre 80 e 1000 terminais, não se sabendo ao certo.
A decisão do juiz é embasada numa denúncia feita no início deste ano, ao Ministério Público Federal (MPF), pelo promotor de Justiça Mauro Zaque.
Ex-secretário de Estado de Segurança Pública, ele teria documentos que evidenciam o esquema da chamada "barriga de aluguel", quando números de telefones de cidadãos comuns, sem conexão com uma investigação, são inseridos em um pedido de quebra de sigilo telefônico à Justiça.
O sistema seria operado por Zaqueu e Gerson Ferreira, que se utilizariam do setor de Inteligência da PM, com anuência do Palácio Paiaguás.
Zaque, inclusive, afirma ter levado o caso ao conhecimento do próprio governador Pedro Taques (PSDB) ainda em setembro de 2015.
A influência do coronel e do cabo em áreas importantes da Policia Militar, do próprio Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público Estadual (MPE) e da Casa Militar do Governo do Estado foi um dos argumentos utilizados pelo magistrado para justificar as prisões.
Já Pedro Taques nega que tenha tido conhecimento dos fatos e determinou ao secretário de Segurança Pública (Sesp), Rogers Jarbas, que investigue os fatos. Jarbas já solicitou o fim do termo de cooperação entre a Sesp e o Gaeco na utilização do sistema “guardião”, responsável pelas escutas telefônicas.
Taques também decidiu realizar uma representação contra Mauro Zaque na Procuradoria-Geral de Justiça (PGJ) e no Conselho Nacional dos Ministérios Públicos (CNMP), por denúncia caluniosa, prevaricação e fraude em documentos públicos.
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