Desde 1989 militando na área jurídica já presenciei e tomei conhecimento de várias situações inusitadas. Hoje vou compartilhar duas delas com os leitores.
A primeira aconteceu em Rosário Oeste no início da década de 90. Tudo começou com duas alunas do ginasial que partiram para as vias-de-fato por causa de um namorado; pra piorar a confusão elas eram vizinhas e a briga envolveu as famílias. Ofensa daqui, ofensa de lá, xinga daqui, insulta dali e até que uma das famílias teve a excêntrica ideia de jogar fezes humanas na casa da outra.
Pronto, agora não tem mais jeito; resolveram ir pra delegacia “dar parte” do caso. O policial registra a ocorrência e a autoridade decide que deve fazer a apreensão da materialidade do crime. Vai a viatura na casa da vítima para recolher o objeto e fazer a fétida apreensão. Como não tinha luva improvisa-se com uma sacolinha de mercado numa das mãos e usa outra para acondicionar o troço, que por sinal estava todo destroçado e espalhado com uma parte grudada no vitrô da cozinha e várias outras caídas na calçada lateral. A viatura retorna à delegacia com o material na sacola e o escrivão confecciona a lavratura formal da apreensão; na mesma semana requisita-se perícia e manda pra criminalística em Cuiabá para saber a natureza do material apreendido. Não restava dúvida, eram fezes humanas, e a cada dia fedia mais, embora estive em envelope lacrado e com mais umas duas sacolas de contenção. Procedimento concluído, hora de mandar para o fórum junto com o inquérito. Surge o primeiro problema, ficou uma catinga insuportável no fórum e o juiz manda o material de volta pra delegacia alegando que não tinha como armazenar. De volta à delegacia, os policiais providenciam mais uns quatro sacos plásticos e lacram com fita adesiva, mas ainda assim, no dia seguinte não tinha quem conseguisse ficar no cartório - tamanho o fedor.
Resultado: colocaram a apreensão do lado de foram pendurada em pé de manga no pátio da delegacia e lá permaneceu por muitos e muitos anos.
O segundo fato aconteceu por volta do mês de setembro de 1997; eu estava na academia de polícia e fazia estágio no plantão metropolitano; naquela época havia um único plantão em Cuiabá e Várzea Grande que funcionava num sobrado no bairro Bandeirantes. No período da tarde recebe-se um chamado para atender uma ocorrência de suicídio num bairro nos fundos do aeroporto de VG. E lá fomos nós, em quatro numa Veraneio; eu e outro delegado estagiário sentados no banco de trás e dois policiais no banco da frente. No caminho o motorista conseguiu a façanha de passar de 120 km por hora em plena via urbana – eu e o outro colega estagiário nos contorcíamos segurando os puxadores e olhando perplexo um pro outro com uma dúvida nos olhos: “pra que tanta pressa pra atender um suicídio que já se consumou?”.
No local a rua estava cheia de gente; a vítima era uma mulher jovem que deixou os filhos na casa da frente, passou o cadeado no portão e foi para a cozinha nos fundos da casa onde cometeu suicídio com um revólver e lá encontrava-se caída ao lado da arma. Lembro-me que a cozinha era bem grande e lá só estavam policiais, peritos e uma pessoa próxima da vítima (vizinha ou familiar). Como de costume, era uma tarde de muito calor na baixada cuiabana, e sobre a mesa havia uma garrafa de tubaína gelada, já aberta e mais ou menos pela metade. Um dos policiais não teve dúvida, pegou um copo do tipo Nadir Figueiredo e dá-lhe tomar tubaína. Quando já estava no segundo copo, o colega estagiário o repreende severamente: você tá louco cara ! A mulher cometeu suicídio, e se antes dela atirar ela colocou veneno nesse refrigerante e usou a arma pra adiantar a morte ?”
Nisso o policial fica pálido e começa a passar mal; corre para o banheiro tentando se livrar do refrigerante de todas as formas possíveis e imagináveis e inclusive teve diarreia instantânea. Felizmente foi só o susto e efeito emocional.
ADRIANO PERALTA é Delegado de Polícia
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